terça-feira, 4 de outubro de 2016

O GOLPE DA MÍDIA! Ou como a mídia nativa faz leituras enviesadas da realidade óbvia


Resolvi escrever menos no Facebook por considerá-lo muito restrito considerando a necessidade de um debate mais sofisticado e seus propósito não serem o de tratar de questões importantes. Não é possível um historiador escrever com alguma profundidade nessa mídia. Devo essa conclusão a um debate com alunos numa página do Face de um grupo ligado à UFG, mas que não deve ser institucional.
Vou analisar somente as manchetes sem ter lido os textos, mas supondo que os títulos representem as ideias que elas pretendem nomear.
Vamos ao que interessa: as manchetes de hoje - 04/10/2016, sobretudo as matérias de opinião dos grandes jornais brasileiros tentam distorcer o que se pode depreender das últimas eleições.
A intenção é desconstruir esse "roteirozinho" pífio dessa "midiazinha" equivalente do Brasil atual.
No O Globo um colunista diz que a falta de votos é decorrente da falta de campanha de rua. Falso! No Brasil os únicos partidos com campanha de rua foram sempre os da esquerda. Além disso muitos cidadãos compareceram e decidiram "não votar". As abstenções têm que ser interpretadas no conjunto e não de forma parcial. A política eleitoral, embora obrigatória, tem-se mostrado completamente contrária aos interesses da maioria. O comentário me lembrou o livro Os bestializados do J. M. de Carvalho no qual o historiador usa o termo "bestializados" de um colunista de época para demonstrar que, ao contrário de bestializados, os cidadãos sabiam muito bem que seu voto nada valia então... Agora não me parece que seja diferente. Os colunistas é que precisam conhecer melhor a história do país.
Outro argumento sem qualquer sombra de evidência que os colunistas retiraram das urnas é: derrota da teoria do Golpe. Conversa fiada! O golpe foi realizado com maestria e já há evidências muito claras de que houve um conluio entre os acusados na Lava-Jato, o Judiciário atrás de aumentos (audio vazado entre Renan e Machado) - apesar de o judiciário deter uma das mais altas remunerações do mundo - e da mídia liberal com posições ultra-liberais que se opunham aos preceitos que orientavam as políticas do PT. O golpe se assemelha muito ao que ocorreu em 1964, guardadas as devidas e profundas diferenças. Mas, a Dilma não deixou por menos, foi ao Senado debater com os adversários políticos do povo brasileiro e tornou claras as intenções dos golpistas. A defesa não é do governo que ia muito mal, mas do poder do voto e da democracia! Sobretudo reconhecendo que o deputado Eduardo Cunha havia garantido a eleição de 150 deputados federais que seguiam sua orientação contra o governo na Câmara, atitude que provocou a progressiva derrota política do governo que não soube exigir de seus "aliados" um mínimo de fidelidade. Temo que houve também ação negligente ou contrária também dentro do PT. As esquerdas, como disse o Mujica, não aprenderam quem são seus verdadeiros adversários, além de serem também tomados um doses variadas de voluntarismo e sede de poder. Um caos que repercute nas sociedades em geral e permitem o avanços do liberalismo econômico devastador como temos vistos nos EUA e em alguns nos países europeus. A imensa maioria dos brasileiros - e até alguns colunistas (bem e mal intencionados ?) - não tem a menor ideia do que é golpe de estado, além das eleições municipais guardarem monumentais diferenças com as gerais.
A última e creio que única acertada se refere à educação e afirma que ela não se dá somente nas salas de aulas. Nós professores de história temos que responder a isso desde nossos primeiros dias em sala de aula. Uma de nossas mais insistentes dificuldades vem das mídias e suas informações, frequentemente, muito distorcidas! Não obstante eu esteja afastado da Educação Básica há pouco mais de dez anos, antes da Internet portanto, as questões sobre o passado na maioria das vezes nasciam desses problemas fundamentais. Eles vem no plural porque, creio que sua origem é dupla: falta de formação e informação, ou verdadeira má fé por parte de quem elabora as pautas e/ou as notícias, mas também do público, além do viés ideológico dos comentaristas. Não vou aprofundar esse debate no momento, mas é fácil demonstrar que argumentos pífios só podem ser acatados por um publico pouco arguto, pouco atento às formas de leitura e manipulação dos aspectos da realidade. Algumas pesquisas ligadas ao que chamamos Didática da História - muitas em andamento - poderiam nos fornecer mais dados sobre esse complexo fenômeno. No campo da Comunicação tais processos também vêm sendo estudados há muito mais tempo, mas as contribuições ainda deixam muito a desejar, talvez por focarem muito nas obras - como é próprio da área - e menos nos públicos e suas respectivas formações e as configurações das suas interações com as mídias. Trabalhos interessantes sobre o tema são de autoria de Williams, Martin-Barbero, Canclini entre outros.